terça-feira, 9 de dezembro de 2014

CAUSA NÃO É JUSTIFICATIVA

Eu sofri violência psicológica a vida inteira de membros da minha família, vizinhos, colegas de escola e amigos por ser gay e afeminado. Eu apanhei na rua mais de uma vez por causa disso. Eu passei anos deprimido por ter tido uma dificuldade imensa de me aceitar como eu era. Agora imagina se eu ficasse por aí falando que não fecho com esquerdohétero, chamando todos eles de ozétero, falando que os argumentos deles são straight tears, me negando a dialogar com eles e tratando todos eles como inimigos. Não importa se minha heterofobia não ia matar ninguém, eu estaria sim adotando um discurso de ódio em resposta a outro.

Minha intenção ao fazer comentários sobre esse tema nunca é condenar as vítimas, mas instigá-las a questionar o ódio que sentem. Ninguém tem o direito de cobrar nada de uma vítima, a vitima nunca está errada. Mas eu não posso simplesmente falar que a resposta que algumas delas estão dando a longo prazo não precisa ser repensada, porque eu realmente acho que precisa. 

Muitas vezes não temos um controle sobre nossa resposta imediata. Mas, de qualquer maneira, existe uma escolha a ser feita a seguir: uma coisa é uma reação de ódio imediata e irrefletida, outra é tornar isso uma estratégia de vida. Eu entendo o que leva algumas vítimas a agir assim. Entretanto, eu não vejo a causa como justificativa para as ações e discursos de ódio que elas possam vir a adotar a longo prazo.

Se a vítima não tem responsabilidade pelos discursos e ações de ódio que passa a adotar, então o opressor, que é fruto da sociedade opressora em que vive, também não tem responsabilidade por oprimir. Eu acho sim que somos frutos do meio em que vivemos e das experiências pelas quais passamos. Mas, exatamente por isso, eu acho que temos que atacar sistemas e não pessoas. Só que eu acho também que todo mundo é capaz de refletir e ser crítico em relação ao contexto social do qual é fruto, fazendo sim escolhas sobre como se posicionar em relação a ele.

Ademais, tenho achado, cada vez mais, extremamente pobre adotar conceitos de identidade de formas tão limitadas. Há pouco tempo, eu percebi que não me identifico e nunca me identifiquei homem. Eu não caibo nessa identidade que me é impugnada. Também não caibo na de mulher. Me identifico muito mais com o gênero feminino na verdade. Mas gosto de ter barba, pênis, de não ter seios. Tenho algo de homem e algo de mulher em mim. E gosto disso.

De qualquer modo, decidi voltar a me declarar sim feminista. E se reclamar, sou feministo então. Só que mais do que lutar pela igualdade de homens e mulheres, eu acredito que é hora de lutarmos, também, contra esse próprio binarismo. Enquanto ele existir, vamos continuar atribuindo diferentes características sociais a machos e fêmeas.

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