sábado, 14 de dezembro de 2013

TERAPIA EM FORMA DE REVOLUÇÃO POP

Com o lançamento do álbum Beyoncé na madrugada de ontem, Queen B imprimiu uma marca forte na história da música pop. Ela teve uma ideia muito simples, do ponto de vista conceitual, mas, ao mesmo tempo, muito complicada do ponto de vista de sua execução. Beyoncé erigiu um novo formato, completamente diferente, de álbum musical. Um “álbum visual”, nas suas próprias palavras. Ao invés de um álbum composto de canções, um álbum composto de videoclipes. Abaixo, segue uma análise de cada um dos vídeos do projeto, no qual a cantora enfrenta seus fantasmas.

Pretty hurts: Uma das qualidades mais destacadas de Beyoncé é sua beleza. Mas o preço caro que se paga para tê-la é o tema do primeiro vídeo do álbum. Nele, Beyoncé é uma candidata a miss que se força a vomitar, sofrer humilhações calada, ingerir drogas, entre outras coisas tão degradantes quanto em nome de um padrão de beleza extremamente difícil de se alcançar. A letra da música fala de uma menina que cresceu ouvindo que o importante é a aparência, e não o que se “tem na cabeça”. No entanto, quando ela é questionada sobre o que a move, um vazio aparece, e ela se depara com a contradição de sua própria resposta: “ser feliz”. Apesar de todo o esforço, ela perde o concurso, de forma que todo o sofrimento se mostra em vão. No final do vídeo, um registro pessoal de Beyoncé participando de um concurso quando criança evidencia a dimensão biográfica da história.

Ghost: A questão do sentimento de vazio em relação à vida volta no segundo vídeo, no qual uma fantasmagórica Beyoncé se pergunta qual é a razão para se trabalhar tanto, se é tudo tão entediante, apenas manter-se vivo?

Haunted: Um vídeo que me lembrou muito Justify Your Love, da Madonna. Beyoncé circula pelos corredores de uma mansão em que cada quarto guarda personagens bizarros, entre eles, uma família convencional, que, no entanto, não tem a vida que os demais possuem, pois é representada por manequins ao invés de pessoas. As demais figuras podem ser assustadoras em suas excentricidades, mas elas são autênticas, e é isso o que lhes dá vida. O início do vídeo tem um diálogo forte com a vídeo-arte. 

Drunk in Love: Uma Beyoncé linda e sensual, mas que se sente como um troféu. Enquanto ela canta apaixonada para Jay-Z, ele adota uma posição indiferente em relação a ela. Atrás da aparente realização dela com o relacionamento dos dois, e do sorriso que parece tão legítimo, um quê de artificialidade paira sobre eles.

Blow: Um quê de Nicki Minaj, em Super Bass. Essa é a minha grande aposta para estourar nas pistas. Uma música bastante comercial e com clima de sensualidade e festa.

No Angel: Um subúrbio negro estadunidense. Valorizado em sua estética e sistemas de legitimação próprios: a ostentação, com carros, motos e até mulheres, a fumaça do fumo, o estilo gangstar dos homens. Apesar das críticas à aparência “embranquecida” de Beyoncé, uma negra loira de cabelos alisados, ela nunca se distanciou de seu posicionamento enquanto negra, algo que está presente na sonoridade e no estilo de todos os seus álbuns. 

Yoncé: Beyoncé ostentação. Esfregando na cara da sociedade que é rica, famosa, invejada e modelo para uma legião de mulheres, e as recalcadas que se mudem.

Particion: Uma Beyoncé que adora e que quer ser desejada. “Homens acham que as feministas detestam o sexo, mas é uma atividade muito estimulante e natural, que as mulheres adoram”. Outra crítica que Beyoncé recebe frequentemente é a de como ela se diz feminista se coloca seu corpo como um objeto de desejo sexual. Mas Beyoncé propõe uma forma de emancipação feminina que não nega os papeis de gênero vigentes, mas usa os elementos que submetem a feminilidade à dominação masculina, como a sensualidade e o corpo, como armas para subvertê-la.

Jealous: Uma continuação do vídeo anterior. Cansada de não ser valorizada, ela vai buscar na rua o reconhecimento que não encontra em sua relação. Mas não encontra ali também o reconhecimento que busca, e então resolve voltar para o aconchego que a relação que possui pode lhe oferecer. Seria uma metáfora de sua relação com Jay-Z? Uma vida tão perfeita aos olhos do público, beleza, família, carreira de sucesso, o que pode estar escondendo de dor e sofrimento interno? Não seria a primeira vez que Beyoncé desabafa sofre uma relação pessoal difícil através de uma música. Ela fez isso em Listen, falando sobre a decisão de cortar seu pai de sua vida profissional.

Rocket: Beyoncé sendo incrivelmente gostosa. Seu corpo é um universo de prazeres. A fotografia e a direção de arte desse vídeo são simplesmente sensacionais. O significado mais puro de ser “sexy sem ser vulgar”.

Mine: o vídeo mais empolgante do álbum. Começa com o clima fantasmagórico de Ghost, com Beyoncé segurando um ser desfalecido e uma máscara, como se simbolizassem seu cansaço e a preocupação constante com a aparência. Ela fala de uma possível separação, que estaria sendo pauta de conversas que estaria tendo, e de não estar se sentindo a mesma desde o “bebê”, em uma aparente clara referência a Jay-Z e Blue Ivy. Mas o clima evolui de uma forma tão natural que se toma um susto quando se percebe onde ele vai parar: o clima de morte e vazio é substituído por outro de celebração, vida e amor. Ela diz que quer acreditar que deveria estar casada e pede uma contrapartida. Precisa esclarecer mais do que ela está falando?

XO: Beyoncé sendo feliz. Entrando em contato com seu público, que é algo que parece alimentar a alma da cantora. Ela é uma fofa, e dá prova disso a cada show, participando do FaceTime de um fã, fazendo Photobomb na foto de outra, pedindo para os seguranças não agredirem o fã que pulou em cima dela e quase a derrubou, no Brasil.

***Fawless: imagens de Beyoncé adolescente competindo com as amigas em um concurso de calouros, e perdendo para um grupo masculino, são intermediadas por “bow down, bitches”. Beyoncé coloca @s inimig@s no lugar e esfrega na cara del@s tudo o que conseguiu. Um texto falado trata da igualdade de gêneros que não existe, desde a educação que se dá a meninos e meninas, e o feminismo é conceitualizado como a tentativa de alcançá-la.

Superpower: um vídeo motivacional sobre o poder de mudar o mundo que temos quando nos unimos em torno de nossas causas. Vários amigos e companheiros de vida de Beyoncé fazem parte do vídeo.

Heaven: “O paraíso não poderia esperar por você”. Antes de Blue Ivy, Beyoncé sofreu um aborto espontâneo, que foi algo muito doloroso para ela e Jay-Z. Ele também já fez uma música sobre esse tema. No seu documentário “Life is but a dream”, ela também trata desse tema delicado e muito triste. Clipe muito sensível, com ótima direção de arte.

Blue: Em seguida ao vídeo sobre a perda, o vídeo sobre a filha. No Rio de Janeiro, com favela contendo muito criança feliz, jogando bola e dançando o passinho, que parece ter encantado a cantora. Essas crianças parecem ser o link que fez com que Beyoncé escolhesse esse cenário para homenagear a filha. A cidade é retratada com muita poesia e beleza própria, dando muito orgulho para mim, enquanto brasileiro. No final, Blue diz algumas palavras, da forma mais fofa do mundo.

Grown Woman: Eu sei o que estou fazendo, a vida é minha, não enche. Essa é a mensagem desse vídeo, que mescla arquivos pessoais de todas as fases da vida da cantora com remontagens deles com ela no presente. A família da cantora está muito presente no clipe. As imagens mostram como ela é treinada para ser a estrela que é desde pequena. Em algumas cenas, ela criança parece estar cantando com uma perfeição espantosa a música da Beyoncé crescida.

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